Rascunho da Sobrevivência no Porto da Esperança – Maria Eleonora Barbosa Mello (Psicanalista SPRJ)

Estamos vivendo num mundo estranho com a chegada de um estrangeiro, o COVID-19. O nosso porto seguro escapou, deixando-nos assombrados, à deriva, sem bóia. Precisamos de um manual do náufrago para realizar esta travessia, trágica, para um novo porto. A meu ver, a esperança é uma aliada, cúmplice, subversiva, para nutrir a força da vida, presente em cada um de nós, no desejo de viver, suprindo a dor da impotência frente à morte anunciada por um vírus, sempre invisível, traiçoeiro, implacável.

A eterna luta, eros x thanatos, o desespero da Barca da Morte. O agente secreto invisível x o encontro humano, independente de credo, raça, cor. Escolhemos a VIDA. A dor imperativa pode e deve fazer parte do esquecimento. Acreditamos na ciência, seus determinantes, na sua busca da verdade, travestindo todos nós em cientistas ávidos por um mundo novo mais humano, mais humilde, mais transparente, onde os arrogantes serão forçados a uma retirada de cena.

A ideologia do triunfo a qualquer preço não terá mais espaço, e sim a vitória, sempre justa. O tempo será redescoberto num novo espaço. Se não podemos abolir a memória da dor, podemos sim transforma-la numa cicatriz.

Maria Eleonora Barbosa Mello (Psicanalista SPRJ)

 

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

Crianças e adolescentes em quarentena – Tânia Pedrozo (Membro Didata da SPRJ)

Vivemos uma situação inédita com a pandemia do coronavírus que gera medos, incertezas, demandando das crianças e dos adolescentes uma participação na vida inteiramente diferente daquela que é a usual nessas faixas etárias. Nesse desconhecido, eles são chamados a ocupar outros lugares na família e em seu aprendizado escolar.

Poucos adolescentes e raras crianças têm autodisciplina para seguir uma rotina de atividades pedagógicas fora da escola e por tempo indeterminado. As crianças, assim como os adolescentes, sentem falta do convívio diário com os colegas. Quando já possuem acesso à internet, eles se falam, jogam em parceria e fazem contato por vídeo.

Nessa quarentena, as escolas, em sua maioria, oferecem atividades pedagógicas, mas, em geral, são poucas as aulas virtuais. Aos pais cabe monitorar o estudo e a realização dos deveres escolares. Não é tarefa fácil.

Os adolescentes, por sua vez, estão em uma fase onde a maior parte dos interesses não são pedagógicos. Longe disso. São tantos os apelos: mensagens nas redes sociais, filmes e séries na TV, jogos eletrônicos, conquistas amorosas, etc., que a aprendizagem oferecida pela escola precisa ser muito estimulante para conquistar a atenção desses alunos. O que dizer, então, do ensino à distância substituindo a aprendizagem presencial? É um mundo novo para professores, alunos e pais, portanto uma experiência de ensaio e erro para todos.

Talvez, o maior ganho desse período de isolamento social seja a proximidade mais intensa de filhos e pais, irmãos entre si, bem como a participação dos filhos nas tarefas caseiras. E isso não é pouca coisa!

O momento atual ensina, sim, mas, não se trata de aprendizagem formal. Crianças e adolescentes estão tendo a oportunidade de aprender algo que não é mensurável, porém fundamental para a formação das pessoas: o valor das trocas afetivas na família e o poder que elas têm de contribuir para a construção psíquica, fortalecer a auto-estima, proporcionando assim condições para lidar com os desafios e com as exigências que fazem parte do viver.

Tânia Pedrozo (Membro Didata da SPRJ/Psicanalista de Criança e Adolescente).

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

Psicanálise virtual e enquadres possíveis – Débora Regina Unikowski (Membro Didata SPRJ / Diretoria do IEP)

Psicanálise via Skype ou WhatsApp não é novidade. Recurso utilizado quando um paciente viaja ou se muda temporariamente. Mas quando tanto analista quanto paciente estão em isolamento social? E o virtual é o modo de encontro por excelência?
A psicanálise, preconizada por Freud, tem no discurso, nas associações livres do paciente e na escuta do analista sua matéria prima. Paciente e analista se encontram num enquadre estável, onde o inconsciente emerge e pode ser trabalhado através da transferência do paciente e das interpretações e contratransferência do analista. Esta relação assimétrica permite projeções, introjeções, insights, reedições e ressignificações de angústias primitivas, atualmente alimentadas pelo medo da pandemia.

O analista recebe o paciente levando em conta não só seu discurso, mas todos os aspectos não-verbais subjacentes. Como chega em cada sessão, como se move, que expressão tem seu semblante e assim por diante. Detalhes que não fazem parte de uma ‘check list’, mas que saltam aos olhos do analista cada vez que apresentam novidades, diferenças do habitual.

Através do Skype ou WhatsApp, ao trabalharmos sem vídeo e com fones, buscando reproduzir a relação analista na poltrona e paciente no divã, recebemos as comunicações do paciente de forma diversa. A recepção, através da audição é mais diretamente solicitada. A fala nos penetra, literalmente, através dos fones de ouvido, garantia de privacidade. As pausas, a respiração, os silêncios e as entonações de voz precisam ser diferenciados dos ruídos da internet. O trabalho interno na mente do analista, para manter o enquadre e sua escuta é bem maior e terminamos cada dia de trabalho, enriquecidos pelos encontros e exaustos pelas solicitações internas e externas.

Felizmente temos o sono e os sonhos, tanto os nossos quanto os dos nossos pacientes, para nos embalar e manter viva a comunicação inconsciente.

Débora Regina Unikowski – Membro Didata da SPRJ / Diretora do IEP/SPRJ
Psicanalista de adultos, adolescentes, crianças e bebês

 

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Suely Balassiano (Psicanalista da SPRJ)

Essa mensagem solidária e de reflexão é dedicada a você, em plena envelhescência, nos seus 65+.

Sim, estamos vivendo tempos inéditos nunca antes vividos de incerteza, inquietude que nos afetam e nos desafiam, diante de um cenário de pandemia do corona vírus, que nos provou sua fúria devastadora, que não respeita fronteiras, que nos impôs isolamento temporário, preventivo e responsável do convívio social, daqueles tanto estimamos, que mudou nossas rotinas, nossos hábitos afetuosos despertando nostalgia dos afagos, afrouxando laços íntimos, vínculos de sustentação física, separações abruptas, traumáticas que nos fazem sentir soltos, à deriva, invadidos pelo sentimento de solidão, desamparo, medo de sermos infectados e/ou agentes infectantes, vivenciando lutos pela perda de parentes ou de amigos, vítimas do covid-19.

Muito idosos argumentam, com certa indignação legítima, que se sentem impotentes, invadidos pela sensação inquietante de estar vivenciando a suspenção do tempo, ter sua intimidade violada e protestam que não podem desperdiçar esse tempo escasso, por demais valioso e curto, de vida que lhes resta.

Importante alerta, para você idoso, de que doses certas de informações confiáveis e esclarecedoras, tendo com fonte as comunidades científicas, são valiosas!

Importante é filtrar o excesso midiático, que gera uma espiral crescente de medo irracional, que de repente nos vemos capturados por uma ansiedade excessiva, incontrolável, tóxica que gera uma espécie de pandemia emocional ou melhor, pânicodemia que nos infecta, provoca estresse, tão danoso para nossa saúde física e mental.

Gostaria de convidar você, idoso, a desviar o olhar, de sair do lugar do medo irracional, que nos aprisiona e paralisa nesses tempos de distanciamento temporário, e ir em busca da rica experiência de um viver criativo! Temos recursos internos incríveis à nossa disposição, vivências emocionais e prazeres adiados, até então inexplorados!

Algumas atitudes simples podem ajudar a amenizar sentimentos de insegurança, solidão, desamparo, por exemplo, leituras que nos fascinam, manter uma comunicação viva através de telefonemas, mensagens de texto, vídeo chamadas, reencontrar amigos, através das redes sociais, que se perderam ao longo do tempo.

As crises que tanto nos desconcertam e, por vezes, nos tiram do eixo, são transitórias, têm prazo de validade, são oportunidades valiosas, com certeza dolorosas, mas também ricas experiências vividas, que nos impõem reflexões e necessidade de renovação, que nos convidam a nos tornarmos mais solidários.
Muito em breve, estaremos reforçando nossos laços físicos e abraços que nos entrelaçam e nos confortam.

Temos a sensação de algo novo estar surgindo, nos unindo seu nome, Esperança!

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

O Vidro Fosco – Terezinha de Souza Agra Belmonte (Psicanalista SPRJ)

E de repente, num mundo super conectado aparece um vírus, cuja imagem tomográfica e topográfica é a de um vidro fosco.
A sociedade globalizada, individual, corporal e do código de barras vivencia uma pandemia. Será a era hikikomori?
Quanto tempo ficaremos isolados, dependentes da comunicação pela tecnologia, sem nos tocar? E esse bombardeamento de informações da mídia? Ela nos comunicando que o planeta está em isolamento social? Um vazio no cenário externo e que nos remete ao vazio existencial interno do cenário dos micros movimentos do psicosoma de vários sujeitos. O que colocar nesse lugar?
Como será a dança do vidro fosco?
As fronteiras fechadas indicam um término temporário ou permanente da globalização? Os macros movimentos externos, corpo mente, sem tempo para o contato das emoções de cada um dão lugar às angústias impensáveis de lidar com um inimigo. Ele e sua invisibilidade impedem a expressão da sensorialidade e nos torna psiquicamente afetados. O impacto, a negação, o medo, a ansiedade, a depressão, a reação aguda ao estresse, além da recidiva de transtornos mentais e agravamento das somáticas, que estavam até então, silenciosos eclodem. Teremos transtornos pós traumáticos?
O quadro clínico, na biomedicina é impreciso, pois, em estudos de casos, não existe padronização nos sinais e sintomas somáticos. Febre ou não? Tosse ou não? Gripe? Não. Afinal, como identificar a Covid- 19? Se estiver em duvida, faça quarentena. Isole-se no quarto e use a tecnologia para não surtar. Os micros movimentos internos e externos mudaram o cotidiano de cada um. Como se faz um improviso? Na dança contemporânea e nas outras artes é o ato criativo.
Vamos estudar o fenômeno hikikomori para nos ajudar a compreender o sofrimento psicológico advindo da combinação de isolamento físico e social.
Estamos no ano de 2020, no vidro fosco e que nos remete a cegueira do que estamos experimentando, há algum tempo. Uma explosão de um processo que identificamos e denunciamos. O caos desabrochou.
Os pesquisadores informam que esse agente inimigo pode confundir os promotores da saúde, na identificação do quadro clínico e radiológico, pois existem outros agentes infecciosos. A imagem geográfica terrestre é a de um baralho todo embaralhado e sitiado. Uma paralisação para nos relacionarmos com os micros movimentos internos e externos: o mundo interno. O objeto relacional é a mídia, além daqueles que ainda estão a nossa volta. A solidão da terceira idade se concretiza. Só dela?
A genealogia de doenças como essa, na nossa trajetória do humano na Terra está sendo revisado.
A mídia nos prepara para uma tragédia planetária. Um evento tão anunciado nos filmes produzidos pelas narrativas cinematográficas nas gerações pós guerra.
A qualidade de vida, o bem estar, a filosofia do wellness e suas dimensões: físico, emocional, social, ambiental, Intelectual, espiritual e ocupacional precisa ser usado dentro do espaço de cada um, num lar em que as gerações mais velhas não podem se comunicar com as mais novas. Esses acabam se sentindo culpados por serem assintomáticos e poder transmitir a doença.
O imaginário social é contagiado de forma trágica e a falta de estratégias concretas para enfrentar a problemática gera agonia.
O paradoxo: uma sociedade pós – moderna, sem tempo de espera, precisa respirar com uma doença que afeta a respiração.   O furor curandis do curar diante da impotência frente ao desconhecido consegue estabelecer metas para promoção à saúde, o cuidado.
A esperança é que, em setembro de 2020 teremos um novo estilo de vida e poderemos contar o numero de pessoas vivas, mataremos as saudades dos beijos e abraços daqueles com os quais estamos acostumados. Será o tempo para os rituais e cerimoniais de despedida dos que se foram sem um adeus.
Cuidados paliativos? Nesse momento estamos vivendo a sua essência dia após dia.
A Psicanálise tem como dispositivo intervir nos psicosomas afetados daqueles que se encontram isolados. Nossa comunidade esquece-se de seus afetos, no corpo máquina existencial. Esse instrumento permite acolher e acompanhar a angustia de pessoas e suas famílias, no corpo vivo de sujeitos e suas singularidades.
Temos um desafio: A Psicanálise on line, a beira do leito nos Centros de Tratamento Intensivo e nas outras Unidades do Hospital Geral para ajudar os cuidadores da saúde e os pacientes.
Enfim, que essa guerra termine logo e que sonhemos com a primavera, que o vidro fosco se dilua e que alcancemos essas cartas do baralho que numa nova dança planetária se desenhe com micro e macro movimentos internos e externos com um novo estilo existencial.

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

Beatriz Andreiuolo (Membro do IEP/SPRJ)

“Fique em casa”, diz a recomendação mais prudente desse momento. A aparente simplicidade dessa recomendação revela o que há de complexo em seu sentido e pode nos levar a pensar se podemos ainda estar em casa em um mundo que não nos conforta nem mesmo na privacidade de nossos lares. É possível que a voracidade com que buscamos superar, através da tecnologia, a solidão e a perplexidade diante do desconhecido só provoque mais desamparo, pois na falta de compreensão do lugar em que vivemos ele se torna estranho para nós. Essa situação não é nova. Ela estava aí, mas ficava mais bem escondida atrás da cotidianidade banal da vida contemporânea. Talvez a momentânea suspensão da ordem costumeira seja uma oportunidade para avaliarmos se a experiência de nossas vidas já não é desértica há mais tempo.

Não é por acaso que no cenário atual Hannah Arendt, a pensadora que buscou responder ao apelo do mundo através da tarefa compreensiva, venha sendo evocada com tanta frequência – seja pelos tempos sombrios ou pela expansão do deserto, duas imagens que frequentam seus ensaios. Ambas apontam para a crescente ameaça de que “o nada e o ninguém” venham a “destruir o mundo”, pois as sombras e as tempestades de areia – movimentos totalitários e os repetitivos mergulhos mal sucedidos do homem em sua subjetividade – colocam em risco a possibilidade de as pessoas distinguirem-se umas das outras em atos e palavras e enfraquecem a capacidade humana de julgar. A ausência de lugar para essas atividades, assim como a dificuldade de enxergá-las, decorre da diluição do âmbito público que requer que haja ao invés do nada, “tudo que há entre nós”, ao invés de ninguém, alguém.

Pode ser que o esforço necessário para compreender o modo como habitamos o mundo requeira um certo esvaziamento: menos consumo, menos ideologia, menos cultura, menos interesses, para buscarmos além dos nossos excessos aquela palavra que escapa todo o tempo: sentido. É que o pano de fundo desse des-abrigo é também a ordem técnica que exaure tudo sem demora, que cultua a eficiência pela eficiência e  faz o mundo parecer cheio de coisas, mas que também nos mostra que apesar das multidões o homem solitário pode estar rodeado por outros com os quais não é capaz de compartilhar nenhuma experiência.

Se Nietzsche foi quem primeiro diagnosticou a desertificação do mundo – “o deserto cresce: ai daquele que encobre desertos!” – , quem primeiro habitou o deserto com consciência foi também a vítima de sua mais terrível ilusão, ao acreditar que o deserto estava em nós. A última esperança dos homens está em não se adaptarem ao deserto, pois, embora ele tenha se tornado nosso solo comum, não somos do deserto, somos mortais em um mundo potencialmente imortal. Por isso, não somos naturalmente seres bem ajustados às condições de não-mundo.

Há, além disso, sofrimento decorrente dessa desertificação – que na atualidade ganhou nomes difusos como vazio, desorientação, depressão, pânico – e ele é precioso para resistirmos a habitar apenas os oásis, as esferas da vida que independem do mundo compartilhado. Nesse sentido, para compreender o deserto e não apenas a nós mesmos não podemos agora escapar de nossos horrores. Não há psicanálise nem remédio que possam nos tirar o sofrimento proveniente da desertificação do mundo; o que podem nos dar são oásis, fontes vitais que nos permitem viver no deserto sem nos reconciliarmos com ele. Se sofremos por essas condições, é porque ainda somos humanos: o perigo maior seria estarmos à vontade no deserto e nele passarmos a nos sentir em casa

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

Pandemia ou o vírus da reflexão – Flavio Gustavo Thamsten Filho (Psicanalista SPRJ)

Tirar o melhor das experiências, ter nelas um aprendizado é indicativo de evoluçao psíquica. Não à toa, nos lutos, a vida assume papel reflexivo.

Vive-se o que ora faz com que as pessoas, na proteção da vida, busquem a reclusão. Situação paradoxal. Virus impositivo que se faz numa mensagem simples e que em muito importa a nós psicanalistas: ou se enfrenta a realidade interna clamante ou a angústia assume o território mental, esvaziando-o dos elementos alimentadores de vida!

Essa a grande luta a ser travada, presença efetiva e fundamental da Psicanálise.

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

Ao se afastar a Humanidade deu as mãos – Rosely Lerner (Psicanalista Didata SPRJ)

No momento dessa ameaça de morte tão impactante e de efeitos imensamente traumáticos, a humanidade se mobiliza no sentido de buscar elos afetivos e fazer frente a esse inimigo comum. Temos assistido a cenas emocionantes nos mais diversos pontos do planeta. O instinto de vida brada por uma salvação como os partisãs lutaram contra a devastação do nazismo até o fim.
Afastada do meu consultório, continuei a levar dentro de mim o setting analítico com cada paciente nesse momento emergencial. Meu contato tem sido ao telefone, porque assim todos preferiram e porque penso que, dessa forma e não por vídeo, tento me aproximar do que tínhamos anteriormente e acessar, de alguma forma,o mundo interno de cada um.
Cada relação é única, um mundo que se descortina. Por vezes surpresas surgem, uma intimidade antes defendida e que agora vem à tona. Como compreender esse processo diante dessa nova forma emergencial de setting? Estaria o paciente menos ameaçado pelo contato direto que se dá no consultório? Teria assim menos medo de seu aspecto mais violento e destrutivo? Ou estaria se agarrando de forma intensa a essa relação como uma maneira de suportar a solidão nessa ameaça de vida?
Como entender aqueles que já viviam num mundo delirante e paranóico, sem conseguir manter essa forma “tão estranha” de atendimento? Outro tipo de fantasias e ameaças.
Vou seguindo a cada dia, tendo notícias do que ocorre nessa dura realidade.Não há trabalho interno possível sem essa noção. De que maneira cada paciente está vivenciando esse temor de acordo com a sua realidade interna e as suas cores é o que procuro compreender todos os dias, contando com minha possibilidade de sentir, pensar e estar ao lado de meus pacientes da forma mais inteira possível.
Não sabemos o que será depois e nem há condição de prever. Apenas temos a noção de que os próximos dias serão bem difíceis. Contamos com nosso psiquismo e nossa capacidade amorosa e criativa.
Abraços a todos.

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)

Tempos de Covid-19 e Confinamento em Casa – Daisy Borges Ribas (Psicanalista SPRJ)

Quem poderia imaginar que um inimigo invisível e desconhecido transtornaria quase toda a população do mundo em 2020? As pandemias ficam registradas na história da humanidade, mas esquecidas na nossa memória. Apenas romancistas, compositores musicais, artistas, criam suas obras com esse passado, suponho. A grande maioria de nós jamais pensou vir a enfrentar tais dificuldades.

O medo do novo desconhecido que ameaça nossa saúde é natural e inevitável, não? No momento inicial nos gera certa turbulência emocional, até que os meios e recursos pessoais e as estratégias governamentais possam responder a contento ao desafio de nos proteger destes riscos anunciados.

 Como lidar com as ansiedades e os riscos de reações depressivas no contexto atual?

     Como diz a música:

     “desesperar, jamais, aprendemos muito nesses anos, e afinal de contas não tem cabimento, entregar os pontos no primeiro tempo…”.

   O que nos cabe agora senão criar meios, buscar forças, para   lidar com as ansiedades e momentos depressivos de modo positivo? Há que se tomar a decisão de não se deixar inundar por ondas de pessimismo por tempo prolongado; depois de completo o ciclo do surto epidêmico, retornaremos para nossas rotinas de sempre.

     Estão em uso sugestões para preservar a sensação de continuidade da existência durante o confinamento, muitas sobre a organização de rotinas das atividades em horários. Desnecessário seria citar os benefícios do trabalho em home-office.

     Estipular um tempo dedicado ao noticiário e mensagens, limitar a própria exposição ao tema, se mostra uma medida necessária de proteção emocional.

     Como o confinamento requer um esforço coletivo, sentimentos de solidão ficam relativizados pela união de todos no enfrentamento do fato.

     Nessa rotina há um tempo maior para o contato entre as pessoas por diversos meios on-line. A comunicação constitui uma área livre, a exemplo das orientações da OMS e MS para o nosso auto-cuidado.

      Informações confiáveis e acolhimento  emocional de um outro nos momentos difíceis, ajudam na redução da ansiedade.

      O confinamento se reduz ao contato presencial, tem por finalidade proteger, sobretudo os grupos vulneráveis, contra os efeitos nocivos de uma disseminação da pandemia que seja veloz. A consciência de estarmos fazendo o melhor eleva a auto estima e revitaliza as forças emocionais.

      Mas a cota de prazeres é fundamental, porque não incluir atividades que nos agradam? Sim, agora nos sobra tempo em casa! E o que fazer de melhor com ele?

       Para momentos de maior angústia estão disponibilizados atendimentos de acolhimento psicológico voluntário via on-line por profissionais especializados em diversas instituições. Dentre elas a SPRJ, Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro com o programa SPRJ SOLIDÁRIA.

       O convite para a disseminação coletiva de esperança, prudência e ajuda solidária nesse tempo de enfrentamento e superação fica aqui lançado.

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Eliana Mello (Psicanalista e Didata SPRJ)

Falar desse momento é tentar traduzir em palavras aquilo que não temos nenhum registro no nosso repertório de vida. É falar de algo que se colocou nas nossas vidas sem nenhum sinal: chegou chegando, nos invadindo, pedindo mudanças bruscas em todos os setores do nosso dia a dia.

Afetou fundamentalmente, os 2 pilares da Existência: Tempo e Espaço. A noção do tempo, completamente alterada na medida em que temos que ficar “confinados” no mesmo espaço.

Vai se perdendo a noção do dia, os dias tendendo a ficar todos iguais. Isso significa que estamos sendo forçados a buscar dentro de nós recursos criativos para criar uma rotina dentro do espaço restringido. E urge cuidarmos do nosso equilibrio psíquico através de tornamos os dias e as noites diferentes, criando rotinas alegres e prazerosas.

 Não é, então, momento para alimentarmos o pânico mas não é sem medo. O medo nos impele a querer cuidar mais de nós e de todos a nossa volta. O medo nos juntou em uma grande rede pela vida para podemos combater o vírus!

E perceber que estamos todos no mesmo barco: rico, pobre, branco, preto, amarelo…

E pode ser uma virada crucial para o nosso planeta,um divisor de aguas: obrigados a parar, estamos tendo tempo para ver o que de fato tem importância. No nosso dia a dia damos importância a tantas coisas que na realidade não tem nenhum valor. E agora debruçado em tamanha restrição e receio, vamos quem sabe, quando tudo isso passar, redimensionar o viver e a nossa relação com a Existência e o Planeta.

Freud, nos diz, “os neuróticos inventam problemas para não se deparar com a Miséria Humana”, e agora, ela se colocou com todas as cores e perigo. Que possamos fazer desse encontro com o REAL, uma possibilidade futura para quem sabe evitar novas repetições semelhantes, não deixando que isso aconteça de novo!

(O material publicado é de responsabilidade única de seu autor)